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CARTA ABERTA DO COLETIVO MUÇULMANAS CONTRA O FASCISMO

Para: órgãos dos direitos humanos, imprensa brasileira, instituições islâmicas, partidos políticos

Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso. Que a paz, a misericórdia e as bênçãos de Deus estejam com o nosso amado profeta Muhammad, com todos os profetas do Altíssimo e todos os brasileiros.
Abrimos este manifesto elucidando que não temos a intenção, muito menos o direito, de representar a totalidade da comunidade muçulmana brasileira. Defendemos firmemente a diversidade de opiniões, seja no interior da nossa comunidade ou na sociedade em geral, e combatemos o sectarismo ideológico e religioso. E, porque somos a favor da unidade na diversidade, queremos colaborar com os debates acerca deste momento político, no qual as contradições se agudizam. Não temos o objetivo de apoiar aqui qualquer legenda ou candidatura, mas queremos discutir princípios e horizontes sociais. Somos mulheres, somos trabalhadoras, somos parte de uma minoria religiosa e queremos ser ouvidas!
Nós, muçulmanas que participamos dos atos em repúdio ao candidato a presidência da Republica, nessa eleição de 2018, Jair Messias Bolsonaro, e as ideologias reacionárias defendidas pelo mesmo, saudamos o povo brasileiro que foi às ruas lutar pela democracia, o pluralismo e os direitos da classe trabalhadora. Destacamos o protagonismo das mulheres que, além de combater o machismo, se colocaram na linha-de-frente em favor da dignidade para todos. Rechaçamos contundentemente a agenda política da extrema-direita que, além de promover a ultra precarização das condições de trabalho e a deterioração das condições de existência, aprofunda ainda mais a marginalização daqueles que são socialmente vulneráveis.
Partilhamos da crença que a defesa dos oprimidos e injustiçados seja um compromisso decretado por Deus, louvado seja o Altíssimo. Tendo a misericórdia como hermenêutica, entendemos que tais direitos devem ser assegurados a todos, sem distinção social, de raça, etnia, nacionalidade, gênero, orientação sexual ou credo.
O Profeta Muhammad, que a paz e as bênçãos de Deus estejam com ele, liderou uma sociedade formada por muçulmanos e não muçulmanos, garantindo a liberdade religiosa e a diversidade étnica e cultural. Diferente do que a mídia imperialista e islamofóbica propaga, concedeu e ampliou diversos direitos às mulheres, incluindo a participação ativa na vida comunitária e política e nos ensinou que toda pessoa é dignitária de direitos fundamentais, tais como saúde, moradia, alimentação, educação, trabalho, tratamento respeitoso e afins. Da mesma forma agiram os governos consultivos que se sucederam.
Por isso, somos radicalmente favoráveis à democracia, que não é apenas um valor abstrato, mas traduz-se na soberania popular exercida por meio de instituições que garantam a participação das bases, para reivindicar e proteger direitos. É na democratização do cotidiano, em todos os níveis da vida social, que se constroem laços de solidariedade.
Somos parte de uma das maiores comunidades religiosas do mundo e uma das mais perseguidas também. No Brasil, somos minoria religiosa, porem temos o respaldo da Constituição Brasileira. Assim sendo, não podemos comungar de uma ideologia que afirma que subjugará as minorias em favor das maiorias e solidarizamos com todas as outras comunidades religiosas que também sofrem tal intolerância. Atravessamos um momento em que os discursos moralizadores, com um viés religioso, dão forma às barreiras simbólicas que sectarizam indivíduos, não só pela religião, mas também por sua posição social, raça, gênero e orientação sexual.
O Islam, que compõe junto com o Judaísmo e o Cristianismo o tripé da fé abraamica, aportou por nossas terras ainda no período colonial, através dos colaboradores muçulmanos vindos na expedição comandada por Pedro Alvares Cabral, e mais tarde através de outros que se estabeleceram nesta terra, fugidos da perseguição religiosa na Península Ibérica ou trazidos à força da África e escravizados, fundadores e integrantes dos quilombos e protagonistas das revoltas abolicionistas. Recentemente, os brasileiros vêm reconhecendo, em numero crescente, o Islam como sua crença, partilhada com um relevante número de imigrantes e refugiados, muitos dos quais atualmente vivem em favelas e periferias subsistindo do trabalho informal e chamados de “escória do mundo” pelo xenófobo Jair Bolsonaro.
O Islam sobreviveu silenciosamente, por muito tempo. Atualmente, tem conquistado um espaço de adesão significativo, passando a incomodar os setores de extrema direita, que usam um discurso preconceituoso e manipulador, construído através da disseminação do medo e personificado na figura de Jair Bolsonaro, cujo discurso deixa clara a intenção de subjugar as minorias, como expressado pelo próprio, pela seguinte afirmação: “Essa historinha de Estado laico não. É Estado cristão. Vamos fazer um Brasil para as maiorias. As minorias têm que se curvar. A lei deve existir para defender as maiorias. As minorias se adequam ou simplesmente desapareçam!”.
Nesse cenário, a ameaça fascista começa a encontrar um solo fértil às ideias hostis. O discurso de ódio é explicado, ironicamente, pela máxima democrática da liberdade de expressão, levada ao extremo de sua existência, fazendo circular livremente o ideário fascista. Acreditamos que, de todas as barbaridades proferidas por este candidato, a mais emblemática, por atingir vários segmentos sociais, foi a citada anteriormente, acerca das minorias se curvarem. Essa frase ecoa cortante no coração daqueles que sofrem diariamente a brutalidade do preconceito e da não aceitação.
Neste mesmo sentido, é inaceitável que Jair Bolsonaro anuncie que não respeitara a demarcação das terras indígenas e não titulará quilombos, obrigações constitucionais do Estado brasileiro. É dever ético de todo brasileiro exigir o cumprimento dos direitos territoriais dos povos indígenas e populações quilombolas, além de políticas reparatórias frente às violências historicamente cometidas contra índios e negros, assim como de qualquer minoria que sofra opressão ou ameaça. Alertamos que Jair Bolsonaro tem feito declarações de cunho racista, seguido por muitos de seus simpatizantes, sendo tal posicionamento criminoso e, obviamente, passível de punição, segundo a Constituição Federal.
Também conhecemos muito bem, na condição de muçulmanas, os efeitos da difusão ideológica dos oligopólios midiáticos e a indústria cultural imperialista que, entre outros fenômenos, produz inimigos imaginários para justificar medidas autoritárias e favorecer políticas de matizes fascistas: agora é o comunista, às vezes é o “islamista” e desde sempre é o favelado, o negro, o índio ou qualquer um que seja um obstáculo as politicas do poder econômico na implantação do neoliberalismo e no crescimento da indústria bélica, uma vez que nesse projeto inclui-se a liberação do porte de armas para a população civil, como extensão do terror do Estado e da violência contra o trabalhador negro e pobre que, no Brasil, já mata um jovem desse grupo absurdamente desfavorecido, a cada 23 minutos.
Esse discurso sectário, na verdade, mascara a real intenção desse projeto que é, nada mais, nada menos do que o combate à democracia e a sua substituição pelo modelo neoliberalista, a ideia de Estado mínimo e a ditadura do medo, e candidatos com a retórica (se é que podemos falar das investidas locutórias desse cidadão como retórica) de Jair Bolsonaro, encontram pleno abrigo nessa conjuntura. Em nome de dis- geoestratégicas e interesses comerciais, o imperialismo promove uma campanha sistemática de difamação do Islam e dos muçulmanos, viola a soberania e a autodeterminação dos povos, patrocina o sectarismo e a desunião (fitnah) no interior da comunidade muçulmana. É inadmissível que nos permitamos o governo de um político que já antecipou sua subserviência a elite neoliberal, assim como a sua associação aos sionistas e, como estes, defende o regime de apartheid étnico e religioso comandado por Israel. Registramos nosso inabalável apoio aos palestinos, muitos dos quais são nossos irmãos de fé.
Dentro das questões pertinentes as mulheres, não é coincidência o aumento dos casos de feminicídio no país, via-de-regra cometidos por “cidadãos de bem” adeptos do reacionarismo. Jair Bolsonaro mascara sua misoginia defendendo uma medida sensacionalista e demagógica como a “castração química”, medida essa que já sabemos ineficaz, uma vez que a maioria dos casos de estupro e cultural, apresentada pela demonstração de poder do macho que se considera superior e mais forte. Também é reforçada a ideia de que existem mulheres que merecem ser violentadas, como se já não tivéssemos um aviltante cenário, no qual há um crime de estupro a cada 9 minutos.
A crueldade misógina de Jair Bolsonaro se confirma na sua coautoria no Projeto de Lei que revoga o atendimento obrigatório às vítimas de violência sexual pela rede pública de saúde. Sem contar as declarações reiteradas de que mulheres devem ganhar menos do que os homens, ainda que exercendo as mesmas funções, e um sem fim de proferimentos machistas. Com referência nas interpretações mais legítimas da jurisprudência islâmica, acreditamos que o corpo feminino não pode ser tocado sem o expresso consentimento, rejeitamos a mercantilização da sexualidade e a objetificação dos nossos corpos, sendo o tão polemico véu usado pelas muçulmanas, que, fundamentalmente, carrega um significado espiritual e de identidade, uma das formas mais contundentes de expressão a essa rejeição.
Por sermos facilmente identificadas quando usamos o véu, carregamos também a enorme responsabilidade de visibilizar nossa comunidade e o Islam. Entretanto, ao sermos identificadas, sofremos preterimento no mercado de trabalho e nos tornamos alvos fáceis e preferenciais de gente covarde e preconceituosa que nos associa às narrativas islamofóbicas, também fomentadas pelo candidato detestável e seu séquito. Com a retirada de direitos e a generalização das subcontratações, decorrentes da reforma da legislação trabalhista, apoiada por Jair Bolsonaro e por outros candidatos do espectro da direita, ficamos ainda mais sujeitas ao assédio moral e à perseguição religiosa no ambiente de trabalho.
E, como já mencionado, sem políticas de reversão das desigualdades salariais entre homens e mulheres, tememos pela nossa subsistência - levando-se em conta que estamos sob a ameaça de perda das poucas proteções sociais e previdenciárias que restaram à classe trabalhadora. Os indicadores demonstram que as mulheres recebem menos, apesar de serem mais escolarizadas do que os homens. E embora Deus tenha exortado muçulmanas e muçulmanos a buscarem conhecimento, sabemos que nosso esforço individual em acumular qualificações acadêmicas ou técnicas não é o bastante diante de um problema estrutural e sistêmico que favorece a exploração de mulheres e negros e, sobretudo, de mulheres negras.
Soma-se a isso o acelerado sucateamento da Educação em todos os níveis, decorrente da falta de investimento crônico, em favor de interesses privatistas, e da monstruosa “PEC da morte”, que estrangula da mesma maneira o orçamento público para a Saúde, assim como outras pastas essenciais ao cidadão. Se não nos apressarmos para exigir de nossos representantes no Congresso Nacional, assim como nos demais âmbitos governamentais, a revogação desta medida, um futuro sombrio se impõe contra todos os brasileiros, comprometendo toda uma geração - os nossos filhos, os novos jovens.
Gostaríamos de lembrar que uma muçulmana de origem árabe, Fatima Al-Fihri, Deus esteja satisfeito com ela, fundou em 859 AD, a mais antiga instituição de ensino do mundo, a Universidade de Al Quaraouiyine na cidade de Fés, no Marrocos. Assim, temos a convicção de que a pesquisa acadêmica e científica também é assunto de mulher muçulmana e, por isso, registramos nosso apoio ao movimento estudantil e ao de trabalhadores da Educação, na legítima e necessária luta por melhores condições de trabalho, ensino e aprendizagem.
Assim sendo, nós, muçulmanas que aderimos ao movimento #EleNão, buscamos uma experiência política que construa um novo modelo de pensamento para nação. Um pensamento que agregue e não que segregue. Dessa forma, repudiamos veementemente todas as formas de intolerância que possam comprometer o convívio salutar dos cidadãos, dentro da diversidade da nossa nação, assim como a supressão de nossos direitos enquanto trabalhadoras e trabalhadores, pela humanização da segurança pública, contra a ideologia bélica, o armamento de civis, por concepções suprapartidárias, por um sistema previdenciário justo e por leis trabalhistas que assistam de fato a classe trabalhadora. Ressaltamos que nossa luta não se restringe apenas a figura pessoal do candidato, mas a todo aquele que reproduz o seu discurso autoritário e preconceituoso.
Poderíamos seguir pontuando muitas outras razões para não votar no detestável candidato a presidência da Republica, Jair Messias Bolsonaro, representante maior da extrema-direita brasileira. Porém, acreditamos que somente ao unirmos as vozes, conseguiremos expressar a nossa mais profunda indignação e repulsa a esse ideário fascista. Concluímos o nosso manifesto com o alerta de que, ainda que Bolsonaro seja derrotado nas urnas, é preciso combater o fascismo nas ruas e em todas as dimensões da vida.
Diante do acima exposto, clamamos às nossas irmãs e irmãos muçulmanos, assim como a quem queira compartilhar desta causa, que estejam atentos à conjuntura política e que se engajem, em uníssono, em nome do bem coletivo, dos princípios éticos e morais e pela integridade, não só da nossa comunidade, mas sobretudo, da nossa nação brasileira.
Wa Allahu aalam. E Deus sabe mais.
#eleNão #eleNunca #eleJamais




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