CARTA DOS CONCLUÍNTES E DISCENTES DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UNIR, TURMA 2015.1
Para: Senhor Reitor da Fundação Universidade Federal de Rondônia
Prezado Senhor Reitor,
Os concluintes e discentes do curso de Pedagogia, turma 2015.1, ao final identificados, em vista do óbito de GRACILENE PINHEIRO DE ASSIS, discente do mesmo curso e turma, solicitam ao senhor a concessão de grau/diploma simbólico à família de nossa amiga e colega de turma.
GRACILENE, ou “Dona Gracilene” – que constantemente pedia que retirássemos o “Dona”, como forma de tratamento – ingressou no curso de Pedagogia da UNIR no ano de 2015. Para muitos, esse é um feito indigno de qualquer registro, dada a pouca estima social dispendida aos cursos de licenciatura, que refletem quase sempre em baixa remuneração e más condições de trabalho. Contudo, para Dona GRACILENE ser discente de uma Universidade Federal e do curso de Pedagogia era algo ostentado com muito orgulho e, para nós, seus amigos e colegas, uma lição.
Muitas pessoas que concluíram o ensino médio há muitos anos sentem uma espécie de impotência quando pensam no ensino superior. Acreditam que se trata de um espaço que não poderia ser mais ocupado por elas, que “passou o tempo”, que não dariam “conta”. GRACILENE concluiu seus estudos há vários anos e também viu diante de si essa barreira, mas a superou. Viu diante de si, também, a imensa tristeza pela morte de uma filha e a imobilidade e ausência de sentido que tal perda traz a qualquer pai ou mãe, e, apesar disso, viu no curso de Pedagogia uma oportunidade de superar a dor e compartilhar seu afeto com seus companheiros de turma, sem nunca ter vergonha de expor tal situação aos seus pares. GRACILENE era mãe, dona de casa e servidora pública. Fazia, como muitas outras mulheres, jornada dupla ou tripla, cuidando de sua família, trabalhando na extenuante função de gari, cuidando da limpeza das áreas públicas do município, sem que algum dia a tivesse impedido de frequentar as aulas, apresentar seus trabalhos acadêmicos, frequentar estágios e, sobretudo, compartilhar suas experiências, amor e cuidado com os demais discentes. Encontrou muitas outras dificuldades ao longo do curso, mas nunca desistiu e nunca teve vergonha de pedir ajuda.
GRACILENE sempre foi, verdadeiramente e sem exagero ou pieguice, uma lição. Do início ao fim.
Tinha a marca da amorisidade, reconhecida por nosso patrono como uma das maiores e mais importantes marcas de quem ensina. Certamente teria se tornado uma excelente professora e cada aluno que tivesse a oportunidade de aprender e ensinar com ela teria tido um raro privilégio e um excepcional exemplo a ser seguido.
Sua morte é uma tragédia para todos que a conheceram e acompanharam. Contudo, gostaríamos que sua marca nessa vida não fosse a sua morte, que se resumisse a uma simples “nota de pesar” emitida pela Universidade da qual tinha tanto orgulho de pertencer. Conceder-lhe, ainda que simbolicamente, o grau de licenciada no curso de Pedagogia faria justiça a sua trajetória, pessoal e acadêmica, atenuaria a dor de familiares, que ao longo de anos testemunharam sua dedicação aos estudos, e confortaria seus amigos e colegas de turma, que não puderam se despedir de alguém que lhes devotou tanto carinho e atenção ao longo do curso.
Acompanhamos, durante semanas a luta de nossa amiga contra o COVID-19 e a vimos perder a batalha, juntamente com outras 90.000 pessoas, também vitimadas pela mesma doença e descaso das autoridades. Gostaríamos, agora, de tê-la não só como colega de curso, mas, também, como colega de profissão, como homenagem mínima à sua memória.
Respeitosamente, assinam:
