MANIFESTO CONTRA A XENOFOBIA NA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE LISBOA
Para: População brasileira e portuguesa
Nós, integrantes da comunidade acadêmica manifestamo-nos contrários a prática de qualquer ato discriminatório na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, bem como nos opomos à postura de diversos órgãos estudantis que apresentam condutada letárgica frente a estes casos, omissão que passa a impressão de “pouco caso” com situações que desrespeitam a diversidade do alunado.
Na Reunião Geral de Alunos (RGA), ocorrida em 20 de abril de 2023, quando se discutia a aprovação de Carta redigida por estudantes brasileiros e dirigida ao Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, em que constavam questões afetas às dificuldades encontradas pelos imigrantes brasileiros que vinham a Portugal para cursar licenciatura/mestrado/doutoramento, inclusive, narrando casos de xenofobia enfrentados por esses discentes nas dependências da FDUL, o Conselheiro Geral da Universidade de Lisboa, Doutor Hélder de Sousa Semedo, realizou intervenção por meio da qual se mostrou contrário a vários dos pontos contidos no documento, mas, sobretudo, aquele que descrevia um caso de xenofobia, ocorrido em 2019, oportunidade em que afirmou ser uma “brincadeira” que já foi e deveria ser esquecida.
O Conselheiro Geral da Universidade de Lisboa, de maneira infeliz, ainda afirmou que a carta, no seu entender, passava a seguinte mensagem: “Lula, é só para dizer que Portugal é um país péssimo, somos super mal tratados, mas mesmo assim somos tão burros que continuamos a ir para lá”, concluindo que, caso a carta fosse aprovada em sede de RGA, as pessoas que a redigiram “mereciam levar com uma pedra”, em clara referência ao episódio de xenofobia supracitado, revivendo o triste episódio de violência.
Não bastasse o lamentável ato citado, os responsáveis pela condução da Reunião Geral de Alunos (RGA), mediante a adoção de formalidades nada críveis e ignorando a manifestação de vontade da maioria presente, recusaram-se a fazer constar em ata as falas do Conselheiro Geral da Universidade, o que resultaria no apagamento da violência vivenciada pelos estudantes brasileiros ali presentes. Maior absurdo impossível!
Apenas 16 dias após a reunião referida, em uma nova RGA, o Presidente da mesa reconheceu - não após muita pressão de vários estudantes - que havia se equivocado e que incluiria, expressamente, as falas do Conselheiro Geral da Universidade de Lisboa em ata. Na mesma RGA foi votada nota de repúdio, idealizada pelas/os participantes do Núcleo Feminista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa contra as falas do Doutor Hélder de Sousa Semedo, nota essa que deveria ser assinada pela AAFDL e publicizada em todas as suas redes sociais.
No entanto, passada uma semana desde a aprovação da divulgação da nota de repúdio, a gestão da AAFDL ainda não realizou a publicação da referida nota nos moldes definidos pelos seus associados, numa conduta contrária aquilo que foi decido pelo corpo discente.
A não publicação da nota de repúdio denota um evidente processo de apagamento da violência vivida pelos estudantes brasileiros. A sensação que toma os estudantes brasileiros é de estarmos imersos em um sufocante processo burocrático, em que as “teias” do sistema agem contrários aos que tentam lutar contra o establishment.
As violências contra coletividades, apenas pela razão de serem quem são, devem ser consideradas como práticas odiosas e serem combatidas por todos os atores sociais.
Não se pode admitir uma conduta dessa no ambiente acadêmico/escolar, local que se espera a multiplicidade de ideias, a pluralidade de opiniões e o respeito à diversidade. A prática de atos discriminatórios de qualquer natureza, bem como a tentativa de apagamento dessas violências com recurso a burocracias seria inadmissível nos corredores de qualquer Faculdade de Direito, e é ainda mais triste quando feitos nos corredores da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, alma mater dos maiores representantes da democracia na República Portuguesa nas últimas décadas.
Assim, nós - os alunos - e os órgãos institucionais que integram a Faculdade de Direito não podemos admitir atos discriminatórios de qualquer natureza e, especificamente, aqueles praticados com fundamento na origem de cada um dos alunos que integram essa instituição de ensino.