Moção de Repúdio sobre a crise e a privatização da água no município de Camboriú
Para: Exma. Prefeita de Camboriú, Ministério Público de Camboriú e Ministério Público do Estado de Santa Catarina
O povo aqui reunido, protagonizando a luta por seu direito à dignidade, expressa uma grave preocupação em relação à crise da água no município de Camboriú e responsabiliza o governo municipal do PSDB pela atual situação de calamidade que assola o coletivo camboriuense. Desde o dia 29/12/2014 todas as regiões da cidade enfrentam, em diferentes intensidades, dificuldades na distribuição de água. Por motivos eleitorais, a Administração Pública de Camboriú esconde do povo a verdadeira situação da água em nossa cidade, bem como segue afirmando que não possuímos orçamento para promover a estrutura necessária ao bom funcionamento dos recursos hídricos. Entendemos que apesar de a dificuldade no abastecimento de água ser um problema antigo e que se repete em todos os verões cujo fluxo de turistas é intenso na cidade vizinha, a responsabilidade jurídica quanto ao município de Camboriú não deixa de ser atribuição da Excelentíssima Senhora Prefeita Luzia Lourdes Coppi Mathias.
Neste sentido, CONSIDERANDO que em seus fundamentos, a Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei 9.433/1997, preconiza que a gestão das águas deve ser descentralizada e participativa. Conforme Art. 1º, inciso VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades;
CONSIDERANDO que a Política Nacional de Recursos Hídricos, preconiza que o Poder Executivo Municipal deve promover a integração das políticas locais de saneamento básico com as políticas federal e estadual de recursos hídricos, conforme Art. 31 desta mesma legislação;
CONSIDERANDO que a Lei nº 11.445/2007, que dispõe sobre as diretrizes nacionais para o saneamento básico, estabelece em seu Art. 2º os princípios fundamentais para os serviços públicos de saneamento básico e entre eles, no inciso XII - integração das infraestruturas e serviços com a gestão eficiente dos recursos hídricos.
CONSIDERANDO que a Lei nº 11.445/2007, dispõe um capítulo inteiro (VIII) sobre a participação de órgãos colegiados no controle social do saneamento básico, e que o Art. 47, recomenda a participação destes nas decisões, assegurando a representação: I - de titulares dos serviços; II - de órgãos governamentais relacionados ao setor de saneamento básico; III - dos prestadores de serviços públicos de saneamento básico; IV - dos usuários de serviços de saneamento básico; V - de entidades técnicas, organizações da sociedade civil e de defesa do consumidor relacionadas ao setor de saneamento básico;
CONSIDERANDO que a audiência pública realizada no dia 7 de novembro de 2014, no horário das 19 horas, no Auditório Ulisses Guimarães, localizado na Rua Getúlio Vargas, 77, centro de Camboriú para apreciação pública do prognóstico, diagnóstico, soluções técnicas e modelagem dos serviços públicos de abastecimento de água e saneamento básico do município de Camboriú e das minutas de Edital de Concorrência Pública e respectivo Contrato de Concessão dos Serviços Públicos de Captação, Tratamento e Distribuição de Água e de Operação do Sistema de Coleta e Tratamento de Esgoto Sanitário do Município de Camboriú, em atendimento ao previsto no artigo 11, inciso IV, da Lei nº 11.445/07 e art. 39 da Lei nº 8.666/93, não foi amplamente difundida entre a comunidade;
CONSIDERANDO que embora houvesse a formação da Mesa Coordenadora dos trabalhos durante a audiência pública, no momento das repostas aos questionamentos da população, somente os representantes da empresa contrata para o estudo obtiveram a palavra, mesmo quando as perguntas eram claramente direcionadas a municipalidade; fato este que impossibilitou que fossem sanadas diversas dúvidas proferidas pela comunidade presente;
CONSIDERANDO que a EMASA – Empresa de água e saneamento de Balneário Camboriú, possui outorga para captar do Rio Camboriú um volume de 700 litros/segundo, quantidade maior do que o volume outorgável, sendo igual a 50% da vazão de referência (aquela com permanência em 98% do tempo conforme a portaria SDS Nº 036/2008) e tendo em vista que para fins de abastecimento humano, segundo o Decreto Estadual Nº 4.778/2006, poderá ser utilizado até 80% da vazão outorgável (40% da vazão de referência), que não são respeitados pela outorga em vigência;
CONSIDERANDO que a Audiência Pública realizada pela Prefeitura de Camboriú resultou em um documento público, assinado por diversos atores sociais, que tem como objetivo impugnar a assembléia, possibilitando a adoção de mecanismo de participação social efetiva no debate deste tema. Documento este que foi protocolado no Ministério Público de Camboriú pelos vereadores Jane Stefenn (PSDB) e Ângelo César Gervásio (PMDB).
Resolvemos:
1) Manifestar repúdio à postura que vem sendo adotada pela Administração Pública de Camboriú, materializada nas declarações dadas em veículos locais de comunicação pela Chefe do Poder Executivo Municipal, a Excelentíssima Senhora Luzia Lourdes Coppi Mathias, de que a situação está sob controle e de que sua gestão vem se preocupando intensamente com a situação em que se encontram os camboriuenses. Tais declarações não são condizentes com a realidade, tendo em vista que até o dia 03 de janeiro sequer havia sido emitido um comunicado oficial orientando a população a respeito das causas para a instabilidade no abastecimento de água, tampouco comunicando qualquer previsão de seu reestabelecimento. Até então, estes comunicados, de acordo com funcionários plantonistas da SESB, não haviam sido feitos na página da SESB e tampouco na página oficial da Prefeitura Municipal de Camboriú porque o serviço é terceirizado. Todavia, apesar de o apoio técnico desta Secretaria ser terceirizado, o serviço público, além de ser pago pelo povo, não deixar de ser responsabilidade moral inexorável da Administração Pública, que responde legalmente pelo município de Camboriú.
2) Manifestar repúdio quanto à justificativa finalmente dada ao povo, na pessoa do Senhor Janir Francisco de Miranda, secretário municipal de Saneamento Básico, de que a dificuldade no abastecimento de água potável deve-se ao fato de que nos últimos dias a população triplicou em nossa região, e o consumo aumentou muito. Compreendemos, pelas razões técnicas e legais já explanadas nesta moção, que esta não pode continuar sendo a justificativa oficial para a dificuldade no abastecimento de água;
3) Manifestar repúdio quanto à possibilidade de concessão da gestão das águas a uma empresa privada, pois se compreende que a articulação entre os poderes públicos municipais de Camboriú e Balneário Camboriú para a criação de um consórcio intermunicipal para a gestão de água e esgoto visando à minimização de gastos públicos e aumento da eficiência e eficácia do serviço para a população das suas cidades é legalmente viável e possível;
4) Solicitar que a Prefeitura de Camboriú realize estudos para verificar a viabilidade de se promover uma gestão de água e esgoto de forma consorciada com Balneário Camboriú, pauta defendida por entidades como o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú. A deliberação destas possibilidades e viabilidades deve ser tratada respeitando o princípio da participação popular, princípio este que, apesar de não ser aprofundado na Lei Orgânica deste Município, é garantia inquestionável da Constituição da República Brasileira de 1988, lei soberana de nosso país.
Sendo o que havia para o momento, subscrevemos.