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INCONSTITUCIONALIDADE DO CONGELAMENTO DOS PISOS DA SAÚDE E DA EDUCAÇÃO NA PEC 241/2016: RESPONSABILIDADE FISCAL DEVE VISAR AO CUSTEIO CONSTITUCIONALMENTE ADEQUADO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Para: Exmos. Deputados e Senadores

A sociedade brasileira sabe ser necessário o equilíbrio das contas públicas, tanto quanto assume e clama ser uma das suas prioridades estruturantes a efetividade dos direitos fundamentais, notadamente saúde e educação.
Não há, nem deveria haver, portanto, contradição na agenda pública entre a defesa da responsabilidade fiscal e a promoção desses nucleares direitos sociais.
A bem da verdade, a boa e equilibrada gestão dos recursos públicos não é um fim em si mesmo, mas condição instrumental indispensável de realização dos fins constitucionais do Estado, dentre os quais emerge a máxima eficácia dos direitos fundamentais.
Tal constatação, embora aparentemente óbvia, guarda consigo conflitos orçamentários e financeiros de larga envergadura em momentos de necessário reequilíbrio nas contas públicas, como o que o país vive atualmente. Atravessar a pluralidade de fluxos de correnteza em relação à gestão das receitas e das despesas públicas à luz desse eixo só é possível tendo na Constituição de 1988 a segura baliza do que pode ou não ser feito.
Nesse contexto é que emerge o debate sobre a Proposta de Emenda à Constituição nº 241/2016, que pretende instituir, no âmbito do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988, o “Novo Regime Fiscal”, por meio do estabelecimento de teto global de despesas primárias e respectivos condicionantes em termos de sanções, exceções e delimitação do cálculo.
Para cumprir o alegado fim de ajustar as contas públicas e assegurar o equilíbrio intertemporal entre receitas e despesas, a equação concebida foi a de fixar o patamar de gasto primário global efetivamente pago em 2016 – por poder ou órgão autônomo – como referência máxima de autorização de despesa para os 20 (vinte) exercícios financeiros subsequentes, hipótese em que será assegurada tão somente a correção monetária pela inflação verificada no ano anterior.
Em igual medida, assegura, na forma do art. 105 a ser inserido no ADCT, tão somente correção monetária a partir de 2018 para as aplicações mínimas em ações e serviços públicos de saúde, de que trata o art. 198, e em manutenção e desenvolvimento do ensino, prevista no art. 212, ambos os dispositivos da Constituição.
A estagnação em valores reais da despesa primária global da União e, sobretudo, dos deveres de gasto mínimo em saúde e educação contida nesse teto será tão mais destacada quanto maior for a expansão da arrecadação, em cenário de retomada da atividade econômica do país, ao longo dos vinte anos para os quais a PEC foi projetada.
Tal lógica relativamente simples, a despeito de extremamente forte, busca inserir novos artigos no ADCT para firmar, dentre outros,:
(1) a designação de “Novo Regime Fiscal” (art. 101 do ADCT),
(2) a fixação do teto propriamente dito (art. 102), possibilidade da sua alteração em 10(dez) anos (art. 103) e sua incidência até mesmo para as emendas parlamentares impositivas (art. 106) e para os pisos da saúde e da educação (art. 105),
(3) o estabelecimento de sanções pelo seu descumprimento (art. 104) e
(4) a tentativa de contenção de passivos futuros eventualmente causados pela ou em decorrência da PEC (arts. 107 a 109).
Seu assento estrutural foi concebido sobre três pilares, quais sejam: a delimitação temporal em vinte anos (a pretexto de cumprir o caráter de transitoriedade que justifica a inserção no ADCT), a mitigação do caráter vinculante da execução das despesas primárias obrigatórias e o afastamento da relação de proporcionalidade entre receitas e despesas como limite fiscal objetivo para as leis orçamentárias anuais.
Contudo, ao invés de realmente instituir um limite global de despesas transparente e universal como devem ser os próprios orçamentos, a PEC 241/2016 prevê a criação de uma espécie de contingenciamento preventivo de despesa primária (teto fiscal = despesa efetivamente paga em 2016 corrigida pelo índice de preços ao consumidor amplo – IPCA), alheio ao fluxo da receita e sem se preocupar ou dirigir-se às despesas financeiras, cujos limites de dívida consolidada e mobiliária ainda aguardam, no âmbito da União, parâmetro normativo, no mínimo, desde 2000, por força da conjunção interpretativa do art. 52, VI da CR/88 com o art. 30 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Aliás, a metodologia do ajuste fiscal ora avaliado reside precisamente nessa paulatina e previsível situação de descasamento entre receitas crescentes e despesas primárias estagnadas, ao longo dos próximos 20 (vinte) anos. O eventual saldo positivo em tal equação será aparentemente destinado à redução dos encargos da dívida pública, para manter sua sustentabilidade intertemporal.
A leitura dos artigos que a PEC 241 busca acrescer ao ADCT (conforme o atual texto do substitutivo já aprovado em primeiro turno na Câmara dos Deputados) permite a compreensão de que o teto fiscal discriminatório e parcial afetará notadamente:
1) as despesas de pessoal, a despeito de já existirem parâmetros e instrumentos de controle no art. 169 do texto permanente da própria Constituição, sobretudo em seus §§3º a 6º. A esse respeito, é interessante notar o grande nível de coincidência de vedações inscritas no art. 104 do ADCT ora proposto com o art. 22, parágrafo único da LRF.
Cabe aqui destacar, como elementos de tensão evidente, tanto a vedação da garantia de revisão geral anual, para fins de limitação ao teto (art. 104, §3º do ADCT), em face da sua irredutibilidade constitucional, quanto a aparente cláusula de não assunção de obrigações de pagamento futuro de que trata o art. 107, I do ADCT proposto pela PEC, a despeito da inafastável sindicabilidade judicial (art. 5º, XXXV da CR/88).
2) os pisos de custeio da saúde e da educação, sobretudo por força do art. 105 do ADCT da PEC 241/2016;
3) o Orçamento da Seguridade Social (no que se inclui a espécie tributária que lhe serve de fonte de custeio, qual seja, as contribuições sociais). Interessante notar aqui a grande distorção interpretativa da exceção contida no art. 102, §6º, inciso I do ADCT, conforme a proposta da PEC 241/2016, com as transferências obrigatórias fundo-a-fundo no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, custeadas pela fonte de receita vinculada do Orçamento da Seguridade Social (contribuições sociais);
4) a separação de poderes, na forma do art. 102, §2º do ADCT, cuja restrição fiscal linear remonta o debate sobre a suspensão do art. 9º, § 3º da LRF por meio da ADI 2.238-5 MC/DF . Em tal decisão cautelar, o Supremo Tribunal Federal considerou que o Executivo não poderia unilateralmente impor limitação de empenhos e de movimentação financeira para a execução orçamentária dos outros poderes e órgãos autônomos, já que isso implicaria “hipótese de interferência indevida do Poder Executivo nos demais Poderes e no Ministério Público”. E, por fim,
5) a pretensão de controle judicial futuro de atos que decorram da aplicação da PEC, na medida em que o art. 107, I do ADCT que ela visa inserir restringe a possibilidade de assunção de obrigações de pagamento futuro, como se criasse uma excludente fiscal de responsabilização administrativa ou judicial das lesões ou ameaças de lesão a direitos oriundas do “Novo Regime Fiscal”.
O rol acima de despesas mais afetadas dá claras indicações acerca dos limites e balizas constitucionais que se apresentam para a proposta do teto fiscal global de despesas primárias. Como visto, o “Novo Regime Fiscal” pretende alterar, via ADCT, tantas disposições estruturais da Constituição e por tanto tempo, que sua proposta de reforma constitucional somente seria processualmente legítima se viesse no próprio corpo permanente da Carta de 1988, isso sem se olvidar de algumas colisões substantivas, que são, por si sós, inafastáveis.
Nem se diga, por oportuno, que o Supremo Tribunal Federal teria feito um exame prévio exauriente acerca da conformidade constitucional da PEC 241 nos autos do Mandado de Segurança 34.448 (MS 34.448-MC/DF) no dia 10/10/2016 e, com isso, estariam refutadas todas as questões ora analisadas.
De plano, cabe lembrar que a apreciação perfunctória da matéria no MS 34.448-MC/DF foi feita em decisão monocrática do Ministro Roberto Barroso, quando houve o indeferimento do pedido de liminar para sustar a tramitação da aludida proposta. Ocorre, contudo, que tal análise judicial, além de não ser definitiva, ficou, por óbvio, adstrita aos pedidos feitos no mandado de segurança e não aferiu, por exemplo, a conformidade da PEC 241/2016 em face dos pisos de custeio dos direitos fundamentais à saúde e à educação de que tratam os arts. 198 e 212 da Carta de 1988.
Os fundamentos da decisão tomada pelo STF resumiram-se à negativa de lesão à separação de poderes, à garantia do voto, secreto, direto, universal e periódico e ao direito de acesso ao Judiciário para fins de preservação da estrutura remuneratória dos servidores públicos.
A esse respeito, cabe, portanto, destacar a forte lição dos professores Fábio Konder Comparato, Heleno Taveira Torres, Élida Graziane Pinto e Ingo Wolfgang Sarlet, para quem o financiamento dos direitos à saúde e à educação são mínimos inegociáveis :

"Há um aprendizado histórico digno de nota na vivência da Constituição de 1988 pela sociedade brasileira: a prioridade do nosso pacto fundante reside na promoção democrática dos direitos fundamentais, com destaque para os direitos sociais, garantes de uma cidadania inclusiva e ativa. Justamente nesse contexto, o regime de vinculação de recursos obrigatórios para ações e serviços públicos de saúde e manutenção e desenvolvimento do ensino tem sido o mais exitoso instrumento de efetividade de tais direitos, ademais de evidenciar a posição preferencial ocupada pela educação e pela saúde na arquitetura constitucional. [...]
Atualmente, porém, somos confrontados pela proposta de redução da vinculação de gasto mínimo em ambos os setores e, o que é pior, pela desconstrução do esforço de chegarmos a 2024 com a meta de investirmos em educação pública na ordem de 10% da nossa riqueza nacional. Uma demanda das ruas que não ganhou eco.
O grande problema da PEC 241/2016, particularmente no artigo 104 [art. 105 no Substitutivo] que ela pretende introduzir ao ADCT, é desconhecer a proporcionalidade entre receita e despesa como metodologia instituída no texto da Constituição de 1988, como proteção formal e material (garantia equiparável ao habeas corpus e ao mandado de segurança, por exemplo) dos direitos à saúde e à educação. [...]
Tal inversão de piso para teto desprega a despesa do comportamento da receita e faz perecer as noções de proporcionalidade e progressividade no financiamento desses direitos fundamentais. Assim, o risco é de que sejam frustradas a prevenção, a promoção e a recuperação da saúde de mais de 200 milhões de brasileiros. Ou de que seja mitigado o dever de incluir os cerca de 2,7 milhões de crianças e adolescentes, de 4 a 17 anos, que ainda hoje se encontram fora da educação básica obrigatória. [...]
Estamos em pleno processo pedagógico e civilizatório de educar e salvaguardar a saúde de nossos cidadãos, o que não pode ser obstado ou preterido por razões controvertidas de crise fiscal. Nada há de mais prioritário nos orçamentos públicos que tal desiderato constitucional, sob pena de frustração da própria razão de ser do Estado e do pacto social que ele encerra."

O dever estatal na consecução das políticas públicas de saúde e educação é processado na justa fronteira da proporcionalidade entre receitas e despesas que os pisos constitucionais asseguram. Assim como os cidadãos, por sua vez, possuem direito subjetivo público à educação básica obrigatória e ao acesso universal, integral e igualitário às ações e serviços públicos de saúde.
Pensar em sentido diverso levará a sociedade brasileira a experimentar, em curto espaço de tempo, a paulatina conversão dos pisos constitucionais que amparam tais direitos fundamentais em volumes cada vez mais significativos de precatórios judiciais. Há nisso, pois, um grave risco fiscal quanto ao adensamento da assim chamada “judicialização” da saúde e da educação nos próximos 20 (vinte) anos, caso a PEC do Teto Fiscal seja aprovada com a restrição imposta pelo aludido art. 105.
Com base nos princípios da vedação de retrocesso e vedação de proteção insuficiente, somente se justifica – em face da sociedade e do nosso ordenamento constitucional – o estabelecimento de nova metodologia de cálculo dos deveres de gasto mínimo em saúde e educação, se ela for uma solução alternativa para melhor proteger a prioridade fiscal de que se revestem. Jamais seria admissível esvaziar-lhes a rota de progressividade, despregando-os do nível da riqueza do país e da arrecadação estatal.
Até para que não haja solução de continuidade nos serviços públicos de saúde e educação, não se pode desconhecer que o dever de aplicação mínima em tais áreas deve ser proporcionalmente progressivo em face do restabelecimento da economia e da expansão dos níveis de arrecadação pelo Estado.
Em igual medida, o ritmo e a metodologia do ajuste das contas públicas deve considerar a equitativa distribuição de responsabilidades e recursos entre os entes da nossa federação. Isso porque o reequilíbrio fiscal de um ente não pode ser feito mediante a transferência – direta ou indireta – de encargos aos demais, sem o devido e pactuado rateio.
Ajuste fiscal algum se sustenta com a pura e simples discriminação entre despesas primárias e despesas financeiras, maldizendo aquelas independentemente do contraste com as respectivas fontes de custeio livres ou vinculadas e da repercussão das despesas financeiras para o equilíbrio global das contas públicas. Tampouco é admissível a mitigação dos pisos da saúde e da educação, em face das exceções estritamente discricionárias e aleatórias, por exemplo, do custeio das eleições e da capitalização de empresas estatais. A via do ADCT e sua transitoriedade não podem simplesmente ferir de morte o texto permanente da Constituição.
A propósito, acerca do controle judicial da efetividade dos direitos fundamentais, absolutamente paradigmático é o firme alerta dado, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, pelo Ministro Celso de Mello, no exame da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 45 (ADPF 45) . Naquela ocasião, o STF enfaticamente assinalou que não cabe a frustração da efetividade de direitos fundamentais em nome de restrições orçamentárias falseadas:

"[...] a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais – além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processo de concretização – depende, em grande medida, de um inescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidades orçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada, objetivamente, a incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do comando fundado no texto da Carta Política.
Não se mostrará lícito, no entanto, ao Poder Público, em tal hipótese – mediante indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa – criar obstáculo artificial que revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência.
Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade."

O legado jurisprudencial da ADPF 45 dado pela Excelsa Corte brasileira é suficientemente forte e claro para alcançar agora a PEC 241/2016: que a sociedade não admita a tese da falta de recursos orçamentários como argumento capaz de legitimar a pretensão do Estado de se desvencilhar de suas obrigações constitucionais para com o pacto civilizatório contido na noção de dignidade da pessoa humana e no título da Ordem Social da nossa Constituição Cidadã.
Nesse contexto, parece-nos claro que a PEC 241/2016 afronta o arranjo sistêmico de dispositivos constitucionais e infraconstitucionais que amparam o custeio dos direitos fundamentais, notadamente por meio de vinculações de receita ou dever de gasto mínimo, como se sucede com a seguridade social e os direitos à saúde e à educação.
Registramos, pois, nossa convicção de que o financiamento mínimo dos direitos fundamentais à saúde e à educação, bem como o orçamento da seguridade social são cláusulas pétreas , pela confluência de três prismas normativos que operam em reforço recíproco:
• revelam a dimensão objetiva – dever estatal de custeio – de direitos subjetivos públicos indisponíveis, materializados em serviços públicos essenciais que não podem sofrer solução de continuidade, são amparados pela aplicação imediata prevista no art. 5º, §1º da CR/88 e contra os quais não é oponível a cláusula de “reserva do possível”;
• possuem a natureza jurídica processual de garantias fundamentais (remédios constitucionais), equiparáveis ao habeas corpus, habeas data, mandado de segurança etc e, por fim, mas não menos importante,
• comportam-se como princípios sensíveis da Constituição de 1988, cuja violação pode ensejar a intervenção federal nos Estados e no Distrito Federal (hipótese tão grave que veda, nos termos do art. 60, §1º, a apreciação de proposta de emenda constitucional no período da vigência da intervenção) ou a intervenção estadual em seus municípios.
Sob qualquer dos ângulos de análise acima, a conclusão a que chegamos é uma só: não cabe impor, via ADCT, uma espécie de “estado de sítio fiscal” que suspenda a eficácia dos direitos fundamentais por 20 (vinte) anos, a pretexto de teto global de despesa primária, como a PEC 241 pretende, independentemente do comportamento da riqueza na economia e da arrecadação governamental.
Ao nosso sentir, as mudanças, de fato, necessárias para reequilibrar as contas públicas e promover o custeio constitucionalmente adequado dos direitos fundamentais não demandam maior inovação legislativa no regime da responsabilidade fiscal. A sociedade brasileira precisa, isso sim, é de compromisso sério com a revisão de privilégios (como o são, por exemplo, as renúncias fiscais concedidas ao arrepio do art. 14 da LRF e os incentivos creditícios, via BNDES, sem qualquer exame de efetividade); precisa mitigar discricionariedades na execução e no exame das contas anuais dos entes políticos (haja vista os rotineiros falseamentos de gasto mínimo e os desvios de recursos para fins nada republicanos); precisa conter abusos (como, por exemplo, o regime de parcelas indenizatórias em detrimento do teto remuneratório do serviço público); precisa investigar e eliminar inchaços no quadro de pessoal; precisa refutar frouxidões interpretativas e acompanhar cotidianamente o fluxo do dinheiro público.
Melhor e mais íntegro controle é ponto de partida, mas não basta, porque as causas estruturais de desequilíbrio fiscal seguem alheias ao debate público provocado pela PEC 241. Essa proposta de um “Novo Regime Fiscal” adia e, de certa forma, mantém oculta a real demanda pela reforma tributária, única capaz de enfrentar a injusta regressividade e a irracionalidade federativa do nosso modelo arrecadatório. Também é necessária a correção de distorções nos regimes previdenciários (geral e próprio tanto dos servidores, quanto dos militares). Mas, sobretudo, é imperativa a necessidade de fixação das balizas para a gestão da dívida pública federal (balizas essas referidas a limites máximos e aos deveres de transparência e motivação). Nessas três grandes fontes de tensão, de fato, reside o núcleo dos maiores conflitos distributivos incidentes sobre o orçamento público, para os quais nossos legisladores deveriam reconduzir inadiavelmente seu foco.
Nosso alerta é o de que não podemos comprar, na realidade brasileira atual, soluções aparentemente fáceis, novas e drásticas para problemas antigos e culturais, pois são, na verdade, ilusões, algumas delas inconstitucionais. Aqui indiscutivelmente o maior problema reside no art. 105, que o substitutivo da PEC 241, aprovado pela Câmara em 10/10/2016, quer inserir no ADCT da Constituição de 1988, cujo resultado prático é a mitigação dos pisos de custeio que amparam a máxima eficácia dos direitos fundamentais à saúde e à educação.
Diante de tais preceitos fundamentais, o desafio que o presente momento nos impõe a todos é o de conciliar, republicana e democraticamente, a busca contínua por responsabilidade fiscal para que o Estado, dentre outras destacadas finalidades constitucionais, promova mais e melhor educação e saúde para o cidadão brasileiro. Vale lembrar, nessa seara, o dever assumido pelo país em diversos tratados internacionais, na forma do art. 5º, §2º da nossa Constituição, de desenvolvimento progressivo dos direitos sociais, econômicos e culturais, em rota de plena e íntegra convergência com o fundamento da dignidade da pessoa humana.
Para além de quaisquer cálculos e metodologias de ajuste fiscal, o que está em jogo é a própria higidez da Constituição de 1988 em seu núcleo de identidade, qual seja: o art. 1º, III, o art. 5º, §1º e o art. 60, §4º, IV.
Nenhuma proposta de reforma constitucional pode pretender substituir a própria Constituição. Eis a última fronteira que assegura a sobrevivência do Estado Democrático de Direito, tal como a sociedade brasileira o inaugurou em 1988 e que cabe a nós, atual geração, defender em todas as instâncias cabíveis, até mesmo no âmbito da republicana sistemática de freios e contrapesos.




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