Abaixo-assinado EXPLICAÇÕES SOBRE OBRA MARGEM RIO GUAPORÉ EM VILA BELA SS TRINDADE - MT
Para: PROMOTOR DE JUSTIÇA DA COMARCA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE – MT
EXCELENTÍSSIMO PROMOTOR DE JUSTIÇA DA COMARCA DE VILA BELA DA SAN-TÍSSIMA TRINDADE – MT
Os cidadãos abaixo assinados e identificados, residentes e domiciliados nesta cidade, vem respeitosamente, requerer o que segue:
Já por vários meses, vem sendo realizada destacada obra às margens do Rio Guaporé, onde se pretende a instalação de não se sabe o quê, julga-se que seja um empreendimento turístico. A referida obra, ocupará uma área de preservação permanen-te, o que exigiria, por certo, audiências com a população para o debate da questão, não desonerando de prévia licença ambiental. Ocorre que, apesar de o local da mencionada edificação merecer especial proteção da legislação ambiental, não se tem conhecimento, até o presente instante, de planta de instalação, da origem dos recursos e de qualquer autorização da autoridade competente, qual seja a SEMA Secretaria Estadual de Meio Ambiente.
De certo, toda e qualquer atividade potencialmente degradante merece pré-via análise de experts, discussão como a população, o que, no caso específico, restou dispensado, sumariamente, pela Prefeitura Municipal.
O Município de Vila Bela da Santíssima Trindade/MT, originado às margens do Rio Guaporé, o qual é tido como o mais belo e esplendoroso da região, seja pela qua-lidade de suas águas, cristalinas, seja pela grandiosidade de sua flora e fauna. As águas límpidas e puras do Rio Guaporé, que se estende por centenas de quilômetros, corre entre belas praias de areias finas, onde margeia plena manifestação do cerrado e da floresta, tanto nas espécies de fauna, quanto de flora.
O Rio Guaporé possui relevante função ecológica sobre a ictiofauna e o bioma da Bacia Amazônica, sendo, assim, merecedor de especial proteção, haja vista que qualquer interferência nas suas características naturais, ocasionada por degradação ambiental, pode alterar a sua capacidade de sustentação, interferindo na sobrevida do curso hídrico, bem como na variedade de espécimes que circundam o referido habitat.
De fato, se não bastasse a limpidez e a beleza do Rio Guaporé, fonte de equilíbrio de toda a fauna existente na região, bem como da sadia qualidade de vida lo-cal, tem-se rica flora, a qual se apresenta numa zona de transição entre o bioma do Cer-rado e da Floresta Amazônica.
Analisando o acima exposto, bem como o conteúdo do Código Florestal, vislumbra-se que a região onde a Prefeitura Municipal leva à frente o seu empreendimen-to encontra-se às margens do Rio Guaporé, numa zona compreendida como área de pre-servação permanente, a qual se apresenta como instrumento merecedor de especial pro-teção jurídica ante as peculiaridades locais e geo-hídricas.
Área de preservação permanente é a área protegida nos termos dos artigos 2º e 3º do Código Florestal, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações urbanas.
A edificação realizada pela Prefeitura Municipal apresenta grave risco de degradação ambiental, o que merece de imediato, a intervenção dos órgãos oficiais habi-litados para tanto.
A importância da tutela ambiental faz-se presente nos termos do que pro-paga o ilustre ambientalista Paulo Affonso Leme Machado, segundo o que se apresenta:
"O ser humano, por mais inteligente e mais criativo que seja, não po-de viver sem as outras espécies vegetais e animais.
Conscientes estamos de que sem florestas não haverá água, não ha-verá fertilidade do solo; a fauna depende da floresta, e nós seres humanos sem florestas não viveremos. As florestas fazem parte de ecossistemas, onde os elementos são interdependentes e integrados." (Paulo Affonso Le-me Machado in Direito Ambiental Brasileiro. 14ª edição, São Paulo: Malhei-ros, pág. 721).
Como já se demonstrou, qualquer atividade potencialmente degradante a ser desenvolvida em área de preservação permanente, segundo a Lei de Política Nacio-nal do Meio Ambiente, exige prévia licença do órgão competente, qual seja a Secretaria de Estado do Meio Ambiente SEMA.
Resta sabido que existe a possibilidade de supressão da vegetação nas APPs áreas de preservação permanente, por motivo de utilidade pública e/ou de inte-resse social. No entanto, para que tal atividade degradadora seja empreendida, mister o prévio licenciamento ambiental, o que, na hipótese em análise, inexiste, pois não é de conhecimento da população.
Certamente, a atuação da Prefeitura Municipal encontra-se em desconexão com o ordenamento jurídico.
Em razão de o Município de Vila Bela da Santíssima Trindade/MT não pos-suir, em funcionamento, Conselho de Meio Ambiente com caráter deliberativo, bem como um plano diretor, para a supressão da APP urbana, a emissão de licença ambiental pela SEMA Secretaria Estadual de Meio Ambiente, se faz necessária. Indispensável, assim, a licença prévia para edificação e a licença de instalação para o regular funcionamento do mencionado empreendimento.
De igual maneira, a legislação vigente considera poluidor a pessoa física ou jurídica responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental, conforme disposto no artigo 3º, inciso IV da Lei nº 6.938/81.
A Constituição Federal, em seu artigo 5º, caput, apresenta a vida como um direito fundamental, o qual o Estado está incumbido de assegurar através de seus entes. Destarte, relacionado com este direito, existe o dever do Estado para com a proteção e preservação do meio ambiente, segundo o previsto no artigo 225, da CF/88, onde se in-clui a proteção à fauna e à flora, bem como aos recursos hídricos.
Nesse âmbito de tutela ambiental, o Código Florestal previu hipóteses de APPs áreas de preservação permanente; algumas conceituadas em razão da situação ecológica e da vegetação, outras relacionadas com a finalidade derradeira das mesmas.
A previsão das áreas de preservação permanente, como já mencionado, encontra-se disposta na Lei nº 4.771/1965, onde, mais precisamente em seu artigo 2º, há o apontamento daquilo que é merecedor de um resguardo legal, impeditivo de antecipada supressão da vegetação e/ou degradação ambiental. Eis, assim, o conteúdo da referida norma:
"Art. 2º Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima seja
1 a 2) Omissis;
3) de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham
de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos) metros de largura;"
Por assim ser, ante a largura aproximada do Rio Guaporé, que varia entre cinqüenta e duzentos metros, toda a região apontada no dispositivo acima é tida como área de preservação permanente, o que impede, num primeiro momento, qualquer tipo de degradação ambiental.
Ora, Excelência, de fato, a mencionada obra, destina-se a um melhor apa-relhamento turístico da região. Certamente, a população não se opõe à referida edifica-ção. No entanto, por outro lado, a obra empreendida pela Requerida, em área de preser-vação permanente, por ora, não pode prosperar desvinculada de prévia licença ambiental e de ampla discussão sobre o que poderá advir.
Nesse sentido, a Lei Complementar Estadual nº 38, de 21 de novembro de 1.995, que dispõe sobre o Código Estadual do Meio Ambiente, exige, para uma possível, e não certeira, licença de edificação em área de preservação permanente, prévio proce-dimento administrativo, seja o autor da atividade degradante ou capaz de causar degra-dação uma pessoa física ou jurídica. Assim, eis o conteúdo do artigo 18, do apontado texto legal estadual:
"Art. 18. As pessoas físicas ou jurídicas, inclusive os órgãos e entidades da administração pública que vierem a construir, instalar, ampliar e funcionar estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambien-tais, consideradas efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capa-zes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento junto à SEMA, sem prejuízo de outras licenças exigí-veis."
Convém ressaltar, ainda, que o Código Florestal ao resguardar a vegetação presente ao longo dos rios, assim o fez para evitar que a degradação ambiental acarrete prejuízos insanáveis aos recursos hídricos pátrios, bem como à fauna existente.
Descumpriu-se, assim, o disposto que assegura melhor proteção às áreas de preservação permanente; descumpriu-se lei complementar estadual que exige prévia licença ambiental à hipótese; o que exige, de certo, plena atuação da Justiça e satisfató-ria resposta deste Juízo.
Assim, Excelência, vê-se completamente preenchidos os requisitos neces-sários para o deferimento de uma medida que se faz totalmente correta ao resguardo do meio ambiente, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.
Registre-se, que a situação é emergencial, posto que os danos podem ser irreversíveis.
Diante de todo o exposto aqui alegado, requer desta Promotoria:
1.) Seja interpelada a Prefeitura Municipal, para apresentar planta de insta-lação, origem dos recursos, publicação em imprensa oficial ou cópia de atas de reunião, dando conhecimento à população do empreendimento;
1.1) Suspender todo e qualquer ato de edificação, construção e obra, leva-do a efeito pela Prefeitura Municipal, na área de preservação permanente urbana situada à margem do Rio Guaporé, neste Município;
1.2) Seja oficiado à SEMA Secretaria de Estado de Meio Ambiente, para que seja feita perícia técnica no local da obra, a constatar possível adequação à área de preservação permanente, local de especial proteção pela legislação ambiental;
Isto posto, considerando o direito de todos a um meio ambiente equilibrado e sadio, que conforme os argumentos supra exarados, há uma efetiva ofensa à plena e necessária tutela ao meio ambiente, bem de uso comum do povo e de direito de todos, de forma que a Prefeitura Municipal de Vila Bela da Santíssima Trindade/MT não está res-peitando; requer a Promotoria de Justiça que sejam tomadas providências cabíveis.
Nestes termos, espera deferimento, por motivo da mais alta justiça e ne-cessidade.
Vila Bela da Santíssima Trindade/MT, 01 de junho de 2012.