Abaixo-assinado Professores da Uerj Contra a Violência e a Repressão do Estado
Para: Governos federal, estadual e municipal
Manifestamos nesse documento um pouco das inquietações que estão nos afligindo nestes últimos quatro meses. Concordando ou não com algumas formas de ação, estamos caminhando para um processo de marginalização e criminalização dos movimentos sociais e das pessoas indignadas. Desrespeitando os procedimentos previstos para detenção nos marcos da legalidade vigente, o que observamos com clareza é uma ameaça à liberdade de expressão e, por extensão, à democracia.
Ressaltamos que essas absurdas prisões arbitrárias, execuções sumárias etc. vêm-se mantendo no Brasil desde o período colonial, variando apenas no rótulo atribuído aos supostos crimes. No século XIX, sob acusação de vadiagem e alcoolismo, as leis colocavam escravos e transeuntes maltrapilhos na cadeia. No século XX, assistimos à perseguição, detenção e tortura da opinião divergente. Em pleno século XXI, estamos diante do assassinato de militantes de movimentos sociais e moradores da favela. Silenciando-nos, somos responsáveis pelos rumos traçados, de mais perseguição e criminalização da pobreza e de qualquer organização social.
No âmbito jurídico-legal, vemos o Estado Brasileiro se afastando do projeto popular aprovado na Constituinte de 1988. Nesse sentido, supostos “vândalos” estão sendo detidos e enviados sumariamente para a cadeia sem a observância da ordem constitucional e do devido processo legal, enquanto assistimos a diversos episódios em que o aparato policial declaradamente forja provas e atira com armas letais em manifestantes, falando em alto e bom som que vai “largar o aço”.Em um momento como esse, no qual o Estado condena pobres, mata Amarildos, espanca educadores e prende cidadãos arbitrariamente, faz-se necessário reforçar a luta por um Estado Democrático de Direito, que respeite a lei.
Neste momento, o pano de fundo é a luta por uma educação pública de qualidade: uma luta de todos nós.Os docentes, e demais profissionais da educação básica, lutam por uma remuneração justa, compatível com a qualificação requerida, por um plano de carreira adequado, e contra os projetos que precarizam e privatizam ainda mais o ensino. Entre eles, destaca-se um projeto paradoxalmente chamado de “autonomia”, no qual os professores de uma disciplina têm que ser “polivalentes”, leia-se, dar aulas de várias disciplinas, usando material didático produzido pela Fundação Roberto Marinho. É preciso garantir melhores condições de trabalho para os profissionais da Educação infantil e básica para que eles tenham liberdade de executar projetos com base pedagógica, voltados para o ensino e aprendizado dos alunos, em vez de aplicarem métodos impostos sem discussão, voltados para o lucro de empresas.
Antes dessa “caça às bruxas”, ocorrida na noite do dia 15 de outubro, já houve outros absurdos semelhantes, denunciados por diversas organizações sociais e individualmente, inclusive por pessoas que agora foram presas e estão sendo acusadas de chefiar uma quadrilha que é formada por indivíduos que não se conhecem e que se encontram nas ruas por compartilharem as mesmas indignações.
Não devemos nos omitir diante de tantos absurdos que estamos presenciando nas ruas e que não são noticiados, concordemos ou não com algumas ações mais violentas de determinados grupos. Não podemos legitimar a “legalização” da perseguição política, em pleno século XXI, por um país que é tomado, principalmente na América Latina, como uma referência nos avanços sociais e pelo suposto respeito de sua pluralidade cultural.
Diante desse cenário a Associação de Docentes da UERJ não pode ficar calada, e vem a público manifestar o seu repúdio...