Contra a internação compulsória e a remoção de pertences de pessoas em situação de rua em São João Del Rei
Para: O povo sanjoanense
À sociedade sanjoanense, às autoridades públicas e à imprensa,
Na nossa terra de tanta história e luta do povo trabalhador, nos deparamos agora com uma proposta absurda e violenta, que ataca justamente os mais pobres, os mais vulneráveis, aqueles que foram esquecidos pelo poder público e agora são tratados como inimigos da cidade.
Um vereador deste município teve a coragem de apresentar um ofício que pede a internação compulsória e a remoção forçada das barracas das pessoas em situação de rua, justificando essa brutalidade como “garantia da dignidade humana” e “segurança para a sociedade”. Mas nós perguntamos: Que dignidade é essa que prende, expulsa e joga na sarjeta quem já perdeu tudo? Que segurança é essa que vem com cassetete e viatura, arrancando as poucas coisas que essas pessoas têm?
O vereador fala em internação compulsória como se fosse um ato de cuidado. Mas ele esconde – ou ignora – que a internação forçada, sem laudo médico, sem autorização judicial e sem acompanhamento social, é crime. A Lei Federal nº 10.216/2001, que protege os direitos das pessoas com transtornos mentais, já deixou claro que ninguém pode ser internado à força sem critérios técnicos e sem a fiscalização do Ministério Público. E mais: o próprio Supremo Tribunal Federal (STF), na ADPF 976, decidiu que as cidades estão proibidas de recolher à força os pertences e remover ou transportar compulsoriamente pessoas em situação de rua.
Se a justiça brasileira já reconheceu que viver na rua não é crime, por que o vereador insiste em tratar essas pessoas como bandidos? Por que ele fala em remover barracas e usar a força policial, quando a cidade sequer oferece abrigo, emprego ou moradia para quem está nas calçadas?
Hoje, em São João del-Rei, não existe um Centro POP, que é o equipamento público que deveria oferecer apoio e orientação para a população em situação de rua. Não há abrigo público, nem programa de moradia assistida, nem políticas de trabalho digno para quem foi expulso do mercado formal. O que há, na verdade, é abandono, invisibilidade e desprezo por parte das autoridades.
E agora querem resolver o problema na base da violência? Querem tirar à força as barracas, os cobertores, os poucos pertences dessas pessoas que já perderam tudo? E depois, vão jogar onde? Na cadeia? No manicômio? Ou na beira da estrada, pra ninguém ver?
A gente sabe muito bem que essa proposta não é pra cuidar do povo da rua. É pra esconder a pobreza. É pra agradar os ricos da cidade, os donos da terra e especuladores que acham que o pobre suja a paisagem histórica.
Nós, que somos o povo trabalhador de São João del-Rei, que pegamos no batente todo dia, que sabemos o que é acordar cedo pra garantir o pão, não vamos aceitar que nossos irmãos e irmãs em situação de rua sejam tratados como lixo.
Se o vereador estivesse realmente preocupado com a dignidade dessa população, estaria cobrando da Prefeitura a adesão ao programa federal "Moradia Primeiro", que já tirou milhares de pessoas da rua em outras cidades do Mundo. Estaria exigindo a criação de um Centro POP, a ampliação do atendimento psicológico e o fortalecimento dos serviços de assistência social. Mas não. Prefere o caminho fácil da repressão, da humilhação e da violência.
Por isso, nós repudiamos com toda a nossa força essa proposta cruel e ilegal. E avisamos desde já: se alguma viatura aparecer pra tirar as barracas, se alguma força policial ousar agredir o povo da rua, estaremos nas ruas, lado a lado, defendendo nossos companheiros e companheiras.
Quem tem fome precisa de comida, não de cassetete.
Quem dorme na calçada precisa de moradia, não de polícia.
Quem luta pra sobreviver precisa de trabalho, não de humilhação.
Resistiremos até que a cidade de São João del-Rei respeite a dignidade e os direitos do povo da rua, porque no nosso povo ninguém deixa um irmão pra trás!!